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terça-feira, 20 de maio de 2014

Estamos concluindo a série de artigos sobre depressão. Neste mês de maio o tema em destaque é:
 
A depressão e a Política Nacional de Saúde do Idoso.
 

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Boa Leitura!

sábado, 5 de abril de 2014

A depressão e a Política Nacional de Saúde do Idoso


1-        Introdução:

O presente artigo tem como objetivo apontar os principais fatores que acarretam a depressão na terceira idade e destacar a Política Nacional de Saúde do Idoso. Buscamos, assim, numa visão pós-moderna, congregar os aspectos sociais, psicológicos e orgânicos que contribuem para produzir e manter o quadro depressivo, dentro de um modelo biopsicossocial.

Sobre esse modelo biopsicossocial, atualmente muito aceito, a medicina poderia atuar com eficácia nos dois primeiros, ficando o aspecto social submetido à atuação sócio-político-cultural, notadamente nessa questão da terceira idade, onde a psicologia atua de forma preponderante.  (Stoppe e Louza, 1999).

As diferenças de sintomatologia da depressão no idoso fortalecem os argumentos que dizem ser este um tipo diferente daquela de outras faixas etárias. Nos idosos, por exemplo, a depressão se apresentaria com sintomas somáticos ou hipocondríacos mais frequentes, haveria menos antecedentes familiares de depressão e pior resposta ao tratamento. Mas a tendência atual não é apontar diferenças marcantes entre a depressão em idosos e a de outras faixas etárias, e sim enfatizar que o diferente é a situação existencial específica do idoso. Do ponto de vista vivencial, o idoso está numa situação de perdas continuadas: a diminuição do suporte sócio-familiar, a perda do status ocupacional e econômico, o declínio físico continuado, a maior frequência de doenças físicas e a incapacidade pragmática crescente são motivos suficientes para um expressivo rebaixamento do humor. Do ponto de vista biológico, durante o processo de envelhecimento é mais frequente o aparecimento de fenômenos degenerativos ou doenças físicas capazes de produzir os sintomas característicos da depressão. Assim, clássicos conceitos de depressão reativa, depressão secundária e depressão endógena se confundem na depressão senil (APA, 1994).

A Organização Mundial de Saúde define o indivíduo como idoso a partir dos 65 anos nos países desenvolvidos e dos 60 anos nos países subdesenvolvidos. A longevidade é sem dúvida um triunfo, quando alcançada com dignidade. O envelhecimento associado às melhorias nas condições gerais de vida é o que se espera de uma sociedade que prioriza o valor do idoso como ser humano digno de respeito.

Você, jovem, já pensou que um dia ser tornará um deles?

A terceira idade chama atenção para as diversas questões físicas, psicológicas e sociais que a envolvem.

Mas que questões são essas?

Conflitos familiares, aposentadoria, surgimento de doenças senis (crônicas), declínio da capacidade funcional, contínuas perdas e, muitas vezes, condições sociais desfavoráveis.

2-        Principais sintomas:

Rebaixamento do humor, redução da energia, diminuição da atividade, alteração na capacidade de experimentar o prazer, perda de interesse, diminuição da capacidade de concentração, associadas em geral à fadiga, mesmo após um esforço mínimo. Observam-se em geral problemas do sono e diminuição do apetite. Existe quase sempre uma diminuição da autoestima, da autoconfiança e frequentemente ideias de culpabilidade e ou de indignidade, mesmo nas formas leves. O humor depressivo varia pouco de dia para dia ou segundo as circunstâncias e pode vir acompanhado de sintomas ditos somáticos, por exemplo, perda de interesse ou prazer, despertar matinal precoce, várias horas antes da hora habitual de despertar, agravamento matinal da depressão, lentidão psicomotora importante, agitação, perda de apetite, perda de peso e perda da libido.

Dentre os sintomas psicológicos, o mais frequente é a chamada anedonia, ou seja, a perda da capacidade de sentir prazer e déficits cognitivos, particularmente de memória. A depressão em idosos é um importante fator para piora da qualidade de vida destes indivíduos, especialmente para os que permanecem não diagnosticados e sem tratamento (MICHELAN, 2011).

3-        Política Nacional de Saúde do Idoso

A Constituição brasileira de 1988 foi a primeira a tratar o idoso e a velhice como um problema social, avançando para além da assistência previdenciária e assegurando a proteção na forma de assistência social. Entretanto, é necessário explicitar e separar o direito à velhice e a proteção à velhice.


Como conduzir a embarcação no mar revolto?

Esperar que o governo elabore políticas públicas não é difícil, vide o cabedal de leis que são promulgadas, entretanto colocá-las em prática de forma a beneficiar integrantes dessa faixa etária é uma outra história. Muito do que se preconiza no papel não passa de ações “politiqueiras”, mera demagogia de uma classe insensível aos problemas da sociedade, principalmente das classes menos favorecidas.

Fala-se, muito, hoje no Brasil da chamada Política Nacional de Saúde do Idoso. O que é isso? Vamos lá!

No Brasil, o direito universal e integral à saúde foi conquistado pela sociedade na Constituição de 1988 e reafirmado com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Lei Orgânica da Saúde nº 8.080/90. Por esse direito, entende-se o acesso universal e equânime a serviços e ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, garantindo a integralidade da atenção, indo ao encontro das diferentes realidades e necessidades de saúde da população e dos indivíduos. Esses preceitos constitucionais encontram-se reafirmados pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que dispôs sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área de saúde e as Normas Operacionais Básicas (NOB), editadas em 1991, 1993 e 1996, que, por sua vez, regulamentam e definem estratégias e movimentos táticos que orientam a operacionalidade do Sistema.

Em 1999, a Portaria Ministerial nº 1.395 anuncia a Política Nacional de Saúde do Idoso, a qual determina que os órgãos e entidades do Ministério da Saúde relacionados ao tema promovam a elaboração ou a readequação de planos, projetos e atividades na conformidade das diretrizes e responsabilidades nela estabelecidas (Brasil, 1999). Essa política assume que o principal problema que pode afetar o idoso é a perda de sua capacidade funcional, isto é, a perda das habilidades físicas e mentais necessárias para realização de atividades básicas e instrumentais da vida diária.

Em 2002, é proposta a organização e a implantação de Redes Estaduais de Assistência à Saúde do Idoso (Portaria nº 702/SAS/MS, de 2002), tendo como base as condições de gestão e a divisão de responsabilidades definida pela Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS). Como parte de operacionalização das redes, são criadas as normas para cadastramento de Centros de Referência em Atenção à Saúde do Idoso (Portaria nº 249/SAS/MS, de 2002).

Em 2003, o Congresso Nacional aprova e o Presidente da República sanciona o Estatuto do Idoso, elaborado com intensa participação de entidades de defesa dos interesses dos idosos. O Estatuto do Idoso amplia a resposta do Estado e da sociedade às necessidades da população idosa, mas não traz consigo meios para financiar as ações propostas. O Capítulo IV do Estatuto reza especificamente sobre o papel do SUS na garantia da atenção à saúde da pessoa idosa de forma integral, em todos os níveis de atenção.

Assim, embora a legislação brasileira relativa aos cuidados da população idosa seja bastante avançada, a prática ainda é insatisfatória. A vigência do Estatuto do Idoso e seu uso como instrumento para a conquista de direitos dos idosos, a ampliação da Estratégia Saúde da Família que revela a presença de idosos e famílias frágeis e em situação de grande vulnerabilidade social e a inserção ainda incipiente das Redes Estaduais de Assistência à Saúde do Idoso tornaram imperiosa a readequação da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI).


Voltando à realidade...

Você já visitou um abrigo de idosos de baixa renda? Na maioria das vezes é uma reprodução dos campos de concentração da Alemanha Nazista.

O nome “Clínica” Santa Genoveva desperta algo em você?

 Seria essa a tal Política Nacional de Saúde do Idoso?

Mediante tal contexto, falar de depressão é a mais pura redundância, já que existe uma imensa fenda entre o que preconiza a política do SUS e as ações práticas não idealizadas.

O que você tem a dizer sobre isso?

Chega a ser hilário quando a tal política menciona que “esforços tendem a concentrar o idoso na comunidade, com apoio social junto à sua família, da forma mais confortável possível”.

4-        Conclusão:

Do ponto de vista filosófico, o cuidado é a essência da vida e é ele que permite "a revolução da ternura ao priorizar o social sobre o individual e ao orientar o desenvolvimento para a melhoria da qualidade de vida dos humanos e de outros organismos vivos. O cuidado faz surgir o ser humano complexo, sensível, solidário, cordial, e conectado com tudo e com todos no universo" (BOFF, 2004, p. 190).

“Ser velho é lutar para continuar sendo homem, num esforço incansável para a manutenção da própria identidade e conquista de cidadania”, Marilena Chauí (apud Bosi), em Memória e Sociedade - Lembranças de Velhos, (pág.18).

Precisamos ser mais críticos em relação às políticas públicas. A aceitação passiva é um passaporte para o descaso. O nosso “grito de guerra” é a única forma de acabar com a demagogia e a prepotência dos que utilizam o poder em favor próprio, aniquilando o direito daqueles que por décadas trabalharam em prol de uma sociedade mais justa e igualitária.

 

 
Referências

Depressão na Terceira Idade, Psicologando artigos. Disponível em http://psicologado.com/psicopatologia/transtornos-psiquicos/depressao-na-terceira-idade

BOFF, L. Conclusão. In: ______. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. 11 ed. Petrópolis: Vozes, 2004.  

APA - American Psychiatric Association: Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (1994). 4a ed. Washington (DC): American Psychiatric Association.

Stoppe, Jr, A. e Louza, Neto, M.R. (Eds.). (1999). Depressão na terceira idade. São Paulo: Lemos Editorial

 

 
 

Depressão na infância - Uma abordagem social




1-  Considerações iniciais

Até meados da década de 1970 não se cogitava sobre esse tema, acreditava-se que a depressão infanto-juvenil fosse rara ou mesmo inexistente.
O reconhecimento do quadro depressivo infantil como transtorno capaz de afetar pessoas dessa faixa etária foi reivindicado pelo IV Congresso da União de Psiquiatras da Infância Europeus, realizado em Estocolmo em 1971 (Annell, 1972). Isso resultou na elaboração de critérios de diagnóstico para o denominando Transtorno Depressivo da Infância e Adolescência (DSM-IV, 1994).

Ao longo dos anos esse tema vem se tornando alvo de crescente preocupação entre os profissionais da área de saúde, devido ao aumento gradativo dos casos. Essa nova construção que fundamenta a noção da depressão infantil na pós-modernidade, suscita alguns questionamentos: 
  1. O que mudou nesses últimos anos para tornar esse assunto relevante? 
  2. As crianças de hoje são diferentes das crianças das décadas passadas?

No que tange tais questionamentos, há algumas situações preocupantes em nossos dias, como a obesidade infantil – Opa! Você mudou radicalmente de assunto? Não, vamos lá.

Índices indicam que crianças com menos de 10 anos apresentam altas taxas de glicemia e colesterol, problemas que poderiam surgir somente em idade adulta. Muito se atribui à massificação dos fast-food e, principalmente, ao excesso de atividades dos infantes. Certa psicóloga comentou que seu cliente de 8 anos, ao chegar à terapia, solicitava: “posso dormir um pouquinho?”.

Por outro lado, as crianças também estão apresentando sintomas depressivos muito cedo. Alguém poderia perguntar: onde você está querendo chegar? 

As situações apresentadas, apesar de divergentes em sua etiologia e sintomatologia, convergem em seus aspectos sociais: as crianças estão se tornando adultas muito cedo. Onde fica o tempinho de brincar, da alimentação saudável e do contato com os pais? Essas consequentes mudanças, e o próprio fato de a criança deixar de existir em sua essência básica, têm acarretado o surgimento precoce de determinadas síndromes, entre elas, a depressão. A pós-modernidade confere às famílias desafios sociais até então ignorados, entre esses a precocidade infantil.
“É uma metáfora simples. Nosso arranjo social, nos dias de hoje, se comporta como um líquido em um recipiente. Ou seja, não se mantém por muito tempo em um mesmo estado. Está sempre mudando. Enquanto gerações passadas se acostumaram a uma estabilidade de todas as coisas, o homem contemporâneo enxerga as rápidas mudanças nos partidos e movimentos políticos, nas causas, nas instituições que acabam, na moda, tudo muda várias vezes. Tenho 88 anos e já vi vários arranjos sociais”, disse Bauman (conceito de “liquidez” da sociedade pós-moderna, Bauman).

2-        Sintomatologia

Os sintomas das síndromes depressivas em crianças não são, necessariamente, iguais aos apresentados em adultos. Estudos nesse sentido levam em consideração as alterações decorrentes de mudanças de faixas etárias.

Este artigo não se propõe a descrever os possíveis fatores físicos da depressão na infância. Nosso foco está na relação organismo/meio como as questões familiares, bem como as dificuldades no ambiente escolar. 

Os sintomas preliminares da depressão na infância podem incluir, por exemplo, uma redução significativa do interesse e da atenção do menor. Em não se tratando de uma depressão biológica ou com importante componente hereditário, algumas causas na relação do indivíduo com o meio podem ser capazes de comprometer o interesse e a atenção da criança, como os conflitos intrafamilares, bem como as dificuldades na adaptação ao ambiente escolar.

Você tem percebido o comportamento do seu filho nas últimas semanas?

Aquela fisionomia triste, comunicação monossilábica, atitudes agressivas. E quando ele se tranca no quarto e já não quer brincar ou mesmo ir para a escola; como diria Hamlet, "Há algo de podre no reino da Dinamarca”. Tendo em vista a importância das mudanças de comportamento infantil, pais e professores devem ficar atentos para acontecimentos que chamam atenção; um grito de socorro pode estar eclodindo: “atenção adultos, estou precisando de ajuda!”.

Você tem conversado com o seu filho nas últimas semanas?

Mudanças de comportamento repentino, tais como: violações às regras sociais, oposição brusca aos pais e professores, são indicativos de que fatores externos, ou mesmo internos, estão acometendo a criança. O que devo fazer? Deixá-lo de castigo, proibir que utilize a internet? Segundo Martin Buber, “O ser humano se torna eu pela relação com o você, à medida que me torno eu, digo você. Todo viver real é encontro”.

O real encontro ocorre pelo diálogo, que é a laboriosa arte do encontro entre duas pessoas, a construção de uma relação profícua. Só assim vamos ajudar a criança a enfrentar o seu, possível, drama existencial.


O baixo rendimento escolar e as dificuldades de aprendizagem também estão presentes nos quadros depressivos da infância, seja da depressão biológica, seja das reações depressivas diante dos problemas vivenciais. Declínio no rendimento escolar, particularmente acompanhado de desinteresse geral, pode ser reflexo de ambiente escolar estressante, por conta de colegas ou professores. A falta de empatia com professores, eventuais situações vexatórias diante dos colegas ou bullying podem resultar em severo desinteresse (PsiqWeb).

Quando a criança deixa de verbalizar suas emoções, perde o contato consigo mesmo e com o meio, um sinal claro de que o isolamento social se instalou. E o que isso acarreta? Um profundo sentimento de tristeza que tende a se agravar, se não forem tomadas providências.
3-  A criança com depressão e a família

Na maioria das vezes é difícil, para a família, perceber e admitir que seu “baixinho” está passando por uma síndrome depressiva.

“Esse garoto não fala com ninguém, ele é manhoso", "birrento", "nervoso", "mal-educado”.

Os sintomas que apontam para a doença só passam a ser percebidos quando o quadro de atitudes e comportamentos é bizarro, ou seja, estranho ao ponto de chamar a atenção dos adultos. Essa incompreensão sobre o que está acontecendo com a criança adia a procura por ajuda profissional e, consequentemente, protela o diagnóstico.
3.1   Cuidados com o infante

A importância do acompanhamento psicológico é fundamental, evitando, assim, a evolução do quadro clínico e, na possibilidade de existirem componentes orgânicos associados, é imprescindível à ação do psiquiatra.
O profissional especializado (psicólogo / psiquiatra) tem condições de avaliar com profundidade, não só as questões decorrentes de fatores biológicos, como as decorrentes de situações vivenciais, tais como: violência física, sexual, maus tratos, bullying, queixas escolares.


4 - Conclusão:

Reflexões sobre o modo de viver das sociedades contemporâneas nos colocam diante do novo, o que implica repensar nosso papel dentro desse contexto. As mudanças que vêm ocorrendo influenciam diretamente as práticas desenvolvidas principalmente nos ambientes familiar e escolar e, consequentemente, o desenvolvimento dos sujeitos inseridos nesse cenário.

Os desafios existenciais não são privilégios unicamente dos adultos, a criança também tem seus desafios, principalmente dentro desse arranjo pós-moderno, onde o embate com o mundo tem seu início muito cedo e o calor humano se dissipa velozmente. Em meio a tais circunstâncias, nossa sociedade tem se tornado cada vez mais complexa, construindo um quadro alarmante de conflitos e de valores. 
É imprescindível que haja esforços efetivos para a compreensão da pessoa humana, principalmente dos seres sensíveis que se colocam diante de nós, em busca de amor, cuidado e respeito. Fechar os olhos para tal situação é construir um casulo e nele se manter hermeticamente fechado, pior, negligenciar nosso papel de pais, cuidadores, professores etc.

“Ser responsável pelo outro” e ‘ser responsável por si mesmo’ vêm a ser a mesma coisa”
(BAUMAN).



Referências:
BALLONE GJ, Depressão Infantil, in. Psiqweb, Internet, disponível em www.psiqweb.med.br, 2010.
BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos. Trad. de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.


SOUZA, Vera Lucia Trevisan. et al. Psicologia, educação e a sociedade contemporânea: reflexões sob a perspectiva da psicologia sócio-histórica. Psicólogo inFormação ano 11, n. 11, jan./dez. 2007.


Paulo Gusmão
Psicólogo Clínico - Méier /RJ
CRP: 05/45814
Tel: 2595-2359 / 97489 -8008 / 97489-8008

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sábado, 7 de dezembro de 2013

Depressão – Um problema inquietante




Considerações iniciais:

As diversas áreas do conhecimento se caracterizam pelo uso de tipos específicos de simbologia, vejamos: para que possamos ter certa noção sobre música é necessário dominar os símbolos musicais (notas, claves, etc.), se desejamos dominar o campo da química é necessário conhecer a simbologia dos elementos químicos. Os profissionais da área de saúde (psicólogos, psiquiatras, médicos) não são diferentes – eles necessitam de uma simbologia que os auxilie a identificar possíveis alterações físicas e mentais; esses símbolos são denominados de sinais e sintomas.

Os sinais são achados objetivos observados pelo (psicólogo /psiquiatra), por ex. afeto rígido e retardo psicomotor; os sintomas são expressões subjetivas descritas pelo paciente, p.ex. humor deprimido e energia diminuída.

Vamos avançar um pouco mais. Quando o profissional da área de saúde coleta, por meio de exames, testes e entrevistas, um conjunto de sinais e sintomas que apenas descrevem um processo patológico, sem que se feche o diagnóstico, dizemos que ele está diante de uma síndrome.

Se esse profissional fecha o diagnóstico, ou seja, consegue interpretar criteriosamente o conjunto de sinais e sintomas que o paciente apresenta, dizemos que ele está diante de um transtorno específico (doença).

Na área de saúde mental, trabalha-se muito mais com síndromes do que com doenças ou transtornos específicos – possivelmente para evitar uma rotulação do paciente. Para facilitar a navegação nos textos utilizaremos a sigla SD em referência ao termo “síndrome(s) depressiva(s)”.

“Em psicopatologia e psiquiatria, trabalha-se muito mais com síndromes do que com transtornos específicos” (Dalgalarrondo).

1-   Introdução

Pacientes com SD tendem a apresentar um número maior ou menor de sintomas, portanto é importante frisar que não temos como objetivo generalizar os quadros depressivos.

As SD são atualmente reconhecidas como um problema prioritário de saúde pública. Segundo levantamento da OMS, a depressão maior unipolar é considerada a primeira causa de incapacidade entre todos os problemas de saúde, elevando os custos sociais e econômicos.

O fenômeno da depressão tem chamado a atenção na atualidade por sua crescente incidência no mundo todo. De acordo com o Relatório sobre a Saúde no Mundo, da Organização Mundial de Saúde (2011), a depressão grave é atualmente a principal causa de incapacitação na população em geral, situando-se em quarto lugar entre as dez principais causas da carga mundial de doenças. De acordo com o mesmo documento, se as projeções se mantiverem corretas, nos próximos vinte anos a depressão deverá ser a segunda das principais causas das doenças no mundo. O Ministério da Saúde calcula que, em um dado momento da vida, entre 13% e 20% da população apresenta algum sintoma depressivo; além disso, o custo agregado por prejuízo ao trabalho é imenso (Wannmacher, 2004).

2-   Características

É comum ouvirmos esse termo em vários segmentos da área de saúde - psicólogos / psicanalistas e médicos lidam costumeiramente com situações que envolvem pessoas com sintomas de tristeza, sem afetividade. Podendo ser utilizado tanto para sintomas isolados – situações do dia a dia – ou associado a diversas manifestações clínicas.

A perda de interesse ou prazer são os sintomas básicos da depressão. Os pacientes apresentam-se tristes, sem esperança, com sentimento de inutilidade. Frequentemente descrevem os sintomas como sendo de dor emocional lancinante, queixam-se, ocasionalmente, de serem incapazes de chorar. Quase todos os pacientes deprimidos (97%) queixam-se de uma diminuição da energia que resulta em dificuldades para terminar tarefas, acarretando comprometimento nas atividades diárias (escola, trabalho) e motivação diminuída para assumir novos projetos. Cerca de 80% queixam-se de problemas para dormir, especialmente despertar nas primeiras horas da manhã, às vezes são acometidos de múltiplos despertares durante a noite, durante os quais “remoem” seus problemas (Kaplan, 1997).

3-   O que é a depressão?

A depressão pode ser vista a partir de três ângulos: como fator afetivo, como sintoma e como síndrome – vejamos:

3.1          Como fator afetivo normal

A afetividade é uma dimensão que colore a existência humana. A ausência de afetos torna a vida psíquica do indivíduo embotada, ou seja, sem brilho, sem cor e sem calor.

 “A vida afetiva ocorre sempre em um contexto de relações do Eu com o mundo e com as pessoas, variando de um momento para outro à medida que os eventos e as circunstâncias da vida se sucedem” (Dalgalarrondo 2008, p.159).

A depressão como fator afetivo apresenta como característica típica um sentimento de tristeza de intensidade leve a moderada. Nesse caso a depressão é reativa e surge em função de uma resposta do organismo a certos eventos, como perdas, derrotas e outras vicissitudes. Em geral, apesar de comprometer certas funções psicológicas como o sono e o apetite, esse tipo de depressão não chega a ser grave; tende a ser de curta duração, ou mesmo proporcional ao evento. Todavia, consiste num sinal de alerta de que o indivíduo está necessitando de apoio emocional, principalmente das pessoas mais próximas a ele.

Deve-se ficar atento para uma possível evolução do nível de tristeza e da sintomatologia da pessoa; lentificação motora, sentimento de culpa, ou mesmo ideias suicidas. Neste caso o quadro pode estar evoluindo para um estado melancólico, sendo imprescindível a intervenção tanto do psicólogo quanto do psiquiatra.

3.2          Como sintoma

Enquanto sintoma, a depressão pode surgir em função de uma enormidade de quadros clínicos, entre os quais: transtorno de estresse pós-traumático, demência, esquizofrenia, alcoolismo, doenças clínicas, etc. Pode ainda ocorrer como resposta a situações estressantes, ou a circunstâncias sociais e econômicas adversas.

3.3          Como síndrome

Enquanto síndrome, a depressão inclui não apenas alterações do humor (tristeza, irritabilidade, falta da capacidade de sentir prazer, apatia), mas também uma multiplicidade de sintomas, entre eles:
  
I. Afetivos:

Tristeza, melancolia (quadro grave), choro frequente, estado de indiferença (apatia), sentimento de tédio, aborrecimento crônico, irritabilidade, angústia, ansiedade e desespero. Vide item 3.1.

II. Instintivos e Neurovegetativos:

Fadiga, insônia, diminuição da libido - incapacidade de sentir prazer em várias esferas da vida (anedonia).

III. Ideativos:

Pessimismo, sentimento de culpa, mágoa, tédio, ideias de morte (planos ou atos suicidas).

IV. Cognitivos:

Déficit de atenção e concentração, déficit secundário de memória e dificuldade de tomar decisões.

V. Sintomas de autovaloração:

Sentimento de incapacidade, sentimento de vergonha e autodepreciação (autoestima baixa).

VI. Sintomas de Volição e Psicomotricidade:

Tendência a permanecer na cama por todo o dia, aumento na latência entre perguntas e respostas, lentificação psicomotora (estupor), fala lentificada, mutismo (negatividade verbal); negativismo (recusa à alimentação, à interação pessoal).

VII. Fenômenos biológicos (neuronais ou neuroendócrinos) associados.

Algumas doenças associam a depressão ao seu quadro clínico, assim, antes de iniciar a psicoterapia ou mesmo o tratamento psiquiátrico e/ou psicoterápico é fundamental que o paciente submeta-se a uma avaliação médica criteriosa, eliminando possíveis fatores orgânicos.
Obs. É importante frisar que estamos nos referindo, neste item, a situações que envolvam a hipótese de algum tipo de organicidade.

A doença da tireoide e outras endocrinopatias podem manisfestar-se como transtorno de humor ou uma psicose; o câncer ou uma doença infecciosa, como depressão; infecções e doenças do tecido conjuntivo, como alterações agudas do estado mental. Além disso, uma série de condições mentais orgânicas ou neurológicas podem apresentar-se primeiro ao psiquiatra (Kaplan, p.271).

3.4          Como doença

A depressão como doença (transtorno) trata-se de um “desafio psicopatológico permanente”. Essa condição tem sido classificada de várias formas, dependendo basicamente da preferência dos autores e do ponto de vista adotado. Na literatura encontramos termos, tais como: transtorno depressivo maior, melancolia, distimia, depressão integrante do transtorno bipolar tipos I e II, depressão como parte da ciclotimia, etc. Não é nosso objetivo aprofundar esse campo, já que nossa meta é atingir um público leigo, cujo interesse limita-se aos aspectos básicos e fundamentais das síndromes depressivas.

4-   Tratamento das síndromes depressivas

Embora a especialidade que trata as SD (em termos farmacológicos) seja a psiquiatria, há uma intromissão de profissionais de outras áreas médicas, tais como: clínicos, geriatras, ginecologistas, etc. que prescrevem medicações de ação psicotrópica (tarja preta), e com isso o paciente é subtratado, agravando o seu estado clínico.

Você já teve conhecimento de um psiquiatra que trata de gastrite, ou de uma pneumonia?

Entretanto, há pessoas que, mesmo em meio ao sofrimento, relutam em procurar um profissional da área de saúde mental (psicólogos e/ou psiquiatras), devido ao estereótipo que “psicólogos e psiquiatras são médicos de loucos”. 

A depressão não pode ser tratada como uma ocorrência isolada, mas a partir do contexto no qual o indivíduo esteja inserido, ou seja, deve-se levar em conta o todo do paciente: dimensões biológicas, psicológicas e sociais. O tratamento deve ser próprio para cada indivíduo, podendo incluir psicoterapia, mudança de estilo de vida e terapia farmacológica de acordo com a gravidade e características de cada caso.

No Brasil, existem os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que proporcionam atendimento gratuito para pessoas em sofrimento mental cuja severidade as impeçam de realizar suas atividades diárias. Conforme documento do Ministério da Saúde (2004), os CAPS têm como objetivo atender à população em sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. É um serviço de saúde mental criado para substituir as internações em hospitais psiquiátricos (Rev. abordagem gestalt /Online/ 2013 vol.19, n.1).

Estudos apontam que tratamentos com psicoterapia combinada com medicação foram considerados mais eficazes do que tratamentos farmacoterapêuticos isolados, mesmo se considerando a necessidade de mais estudos nesta direção. Assim sendo, vislumbra-se o papel essencial que a psicologia pode exercer no desenvolvimento de intervenções que possam contribuir para amenizar o sofrimento do paciente em depressão.

5-   Conclusão

Na sociedade pós-moderna o mal-estar tem assumido novas dimensões, onde a relação entre organismo e meio fica evidente nos registros do corpo e da ação; dores diversas e inespecíficas, sensações de completo esgotamento, stress.

Esta nova modalidade de mal-estar implica numa substancial alteração no nível psicológico do indivíduo, resultando em isolamento, tristeza e alterações de humor, um “prato cheio” para a proliferação das síndromes depressivas.

Com isso a concepção de uma existência saudável fica seriamente comprometida. Entretanto o que se propõe hoje são ações de prevenção (profilaxia), na busca de uma vida mais saudável. Segundo Bohoslavsky, “não são as doenças que definem os indivíduos, mas sim os indivíduos que definem as doenças”.

Partindo do princípio que somos seres de relação, fica óbvio que o isolamento contribui em muito para o aparecimento de sintomas depressivos. O contato entre os seres é condição sine qua non para uma vida saudável. Torna-se necessário compreender que não basta apenas estar no mundo, mas sim, estar e interagir com ele, sem necessariamente responder as exigências massificadas de um contexto pós-modernista onde o ter é mais importante que o ser.

Viver corretamente não é mais apenas o cumprimento de uma ordem ética ou religiosa. Pela primeira vez na história, a sobrevivência física da espécie humana depende de uma radical mudança do coração humano. Todavia, uma transformação do coração humano só é possível na medida em que ocorram drásticas transformações econômicas e sociais que deem ao coração humano a oportunidade para mudança, coragem e visão para consegui-la. (Erich Fromm)


Valorize o seu viver!

REFERÊNCIAS:

COSTA,  Elisabeth M. Sene: Universo da depressão. São Paulo: Editora Agora.

DALGALARRONDO, Paulo: Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2ª Ed. São Paulo: Artmed, 2008.

KAPLAN & SADOCK: Compêndio de Psiquiatria. 7ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 1997.



Paulo Gusmão
Psicólogo Clínico - Méier /RJ
CRP: 05/45814
Tel: 2595-2359 / 97489 -8008